segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

"Causos" da Segurança - Revista Proteção

Histórias divertidas vivenciadas por profissionais de SST - 2012
"Causos da Prevenção" publica alguns fatos vivenciados por profissionais de SST, narrados por um contador de histórias, Seu Guto Velhada.

Se você tem uma história interessante ou engraçada e quer vê-la retratada na Revista Proteção, envie para redacao2@protecao.com.br, que o Seu Guto vai ter prazer em retransmitir o causo.


"TÔ FICANDO ATOLADINHA"!

Ilustração Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada

Caridade é uma palavra que procura expressar um sentimento ou uma ação altruísta de ajuda a alguém sem a busca de qualquer recompensa. Só que na prática se pratica a caridade por diversos motivos, podendo depender dos valores, das crenças, da religião e tantas outras variáveis que não cabe­riam aqui. No entanto, algumas pessoas não querem caridade, não querem a "pena" de ninguém. Elas querem simplesmente vencer, o que nem sempre acontece.

Em uma empresa prestadora de serviços de SST, havia uma funcionária que pas­sava por dificuldades financeiras, a tal ponto que passou a vender vários itens de sua casa, inclusive o celular, que era um destes aparelhos bem modernos.

Tocado pela situação delicada da funcionária, um dos gerentes da empresa comprou o celular, que era bonito, funcional e tinha muitos recursos. Então, apesar do seu propósito de caridade, ele gostou da aquisição. Tanto que no dia seguinte ele já o usava normalmente, levando-o até mesmo numa importante reunião, com um dos seus melhores clientes.

A reunião transcorria tensa e repleta de cobranças, que, por alguns segundos fez o caridoso gerente se questionar sobre o que es­tava fazendo ali. Só que de repente, uma música, que come­çou num som baixo e foi num crescente, começou a tomar con­ta da sala de reuniões. Quando chegou no refrão, todos se es­pantaram, pois a letra dizia o seguinte:

- "Quem é? Sou eu bola de fogo, e o calor tá de matar. Vai ser na praia da Barra que uma moda eu vou lançar. Vai me en­terrar na areia? Não, não, vou atolar. Vai me enterrar na areia? Não, não, vou atolar. Tô ficando atoladinha. Tô ficando atola­di­nha. Tô ficando atoladinha".

Imediatamente ele pensou: "Que ridículo". Nisto, todos se o­lha­ram primeiramente sérios. Depois, na face de um a um fo­ram surgindo sorrisos, que foram se repetindo. Os dentes foram ganhando uma visão ampla. Ao fim, todos estavam com um sorriso gostoso no rosto. Foi só então que ele percebeu que o som vinha de seu celular. Todo envergonhado pela cena que acabara de criar, ele pediu desculpas e desligou o aparelho.

No entanto, ao voltarem ao tema da reunião, todo mundo estava mais aliviado. As ideias voltaram a fluir e soluções ­foram apresentadas e acatadas. Pena que o nosso gerente tenha escolhido a vergonha, afinal, este toque exótico do celular foi a recompensa por ele ter sido sincero e praticado a caridade.


PLANTÃO NO MEIO DA RUA

Ilustração Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada, com a colaboração do leitor Elton Souza Cordeiro

Uma das colunas mais lidas da Revista Proteção é a Coluna Radar. Por meio dela, a revista mostra, mensalmente, os vários acidentes que ocorrem no país com os nossos trabalhadores, sendo que sem exceção, sempre há pelo menos uma morte por eletricidade. Só que a eletricidade está em todo lugar e na vida de todo mundo. Na empresa, na escola, no cinema, no tea­tro e, principalmente, nas avenidas, ruas e travessas de nossas cidades. Basta faltar luz nos hospitais, nos supermercados para todo mundo ligar para a con­cessionária perguntando quando volta. Se for na última semana da novela então, é um Deus nos acuda.

O contato com a eletricidade pode provocar vários e­feitos fisiológicos no ser humano (eletrização, tetanização, pa­rada respiratória, asfixia, fibri­lação ventricular) que podem levar a pessoa a óbito. Para ­evitar que algo assim acontecesse, o técnico em Segurança do Trabalho de uma Distribuidora de Energia Elétrica de uma cidade do Norte do Brasil vivenciou uma situação inusitada. Ao se dirigir ao trabalho num destes dias de sol forte, em que nossa visão precisa de óculos escuros pa­ra nos proteger dos efeitos da radiação solar, ele se deparou com uma cena que ocorre com bastante frequência em nossas cidades: um fio de consumidor partido bem no meio de uma das avenidas mais movimentadas da sua cidade, sendo que tal fato foi ocasionado por um caminhão de transporte de car­ga pesada.

Imediatamente após a ocorrência do incidente, o técnico de segurança passou a acenar para que os motoqueiros desviassem, evitando, assim, que o fio partido os atingisse pelo pescoço, o que, provavelmente, os levaria ao chão ou a situações bem piores. Além disto, ele solicitou à dona do ramal partido uma vassoura para retirar o fio do meio da rua. Por fim, ligou para o Plantão da empresa para atender esta ocorrência, uma vez que o fio estava energizado.

Foram longos 30 minutos debaixo de um sol de rachar. Enquanto segurava a vassoura com o fio na ponta, o povo que passava na rua gritava:

- Tá louco? É maluco? Vai ser atropelado! Entre outros termos absolutamente desnecessários.

O fato é que ninguém percebeu que ele estava ali protegendo vidas, assumindo um compromisso como cidadão e prevencionista. Que o seu exemplo faça eco para muitas gerações, pois, com seu ato ali, foi plantada uma semente para o fu­turo.


CERTIFICAÇÃO ÀS PRESSAS
Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada

Já faz algum tempo que as organizações passaram a buscar um desempenho ambiental correto. Mas como só isto não basta, elas acabam optando por um sistema de gestão mais estruturado, podendo optar por certificar ou não este Sistema de Gestão Ambiental. Às vezes são os próprios clientes que impõem isto. Na indústria automobilística, por e­xemplo, o pedido é que busquem estabelecer, implemen­tar, manter e aprimorar seu Sistema de Gestão Ambiental para depois buscar a certificação por uma or­ganização externa.

Foi o que aconteceu numa mé­dia empresa da cadeia automobilística da Região Sudeste. Ela estava sendo pressionada por seus clientes pa­ra conseguir a Cer­ti­ficação na NBR ISO 14001. Com base nisto, foram concentrados recursos e esforços para que a meta fosse atingida. Uma técnica em Segurança do Trabalho que trabalhava na empresa ficou en­car­regada de atuar na questão operacional para atender aos requi­sitos da Norma. Quando uma pré-auditoria foi realizada e muitas não conformidades foram detectadas, um plano de ação foi elaborado. Nada es­morecia o ânimo da equipe e todos sabiam que a missão tinha de ser atingida, pois, do contrário, as vendas iriam evaporar. Só que, assim que foi marcada a auditoria de certificação, o nervosismo tomou conta da equipe, pois precisava ser cons­truída uma rede de coleta de efluentes e todos sabiam que não ia dar tempo de fazê-la.

Quando chegou o grande dia, os auditores foram logo pedindo evidências disto e daquilo, até que no terceiro dia um dos auditores disse que desejava conhecer a rede de coleta de efluentes. Prontamente, a técnica de segurança o levou ao local onde tinham seis tampas de caixa-d`água de 500 litros alinhadas no chão. Só que, antes de levá-lo ao local, ela passou no almoxarifado e pegou dois pés-de-cabra e os levou na mão. Chegando ao local, disse:

- É aqui. Pegue este pé-de-cabra e vamos levantar a tampa. O único problema é que o cheiro não é muito bom.

Neste meio-tempo, o suspense predominou no ar. Os trabalhadores da empresa estavam escondidos e com medo do pior acontecer e o auditor descobrir que não havia nada debaixo da tampa. Só que isto não aconteceu, pois, após ouvir a fala da profissional de segurança, ele fez uma cara de nojo, e ­ressaltou:

- Não precisa, não. Está aqui, estou vendo. Vamos continuar a auditoria.

Foi difícil não ouvir as gargalhadas da equipe toda ao longe. Até porque a certificação veio e as vendas continuaram. Algum tempo depois, a rede de coleta foi feita, mas ninguém es­quece esta história.


JOGANDO A TOALHA

Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada, com a colaboração do leitor José Carlos S. Goiana

Ao se procurar alguém para atuar como cipeiro, busca-se o perfil de alguém dedicado e que acredita na causa. É preciso ser perseverante, educador, ser um formador de opinião. Ser aquele que procura fazer amigos e que gosta do que faz. Mas há quem ache que não é isto, uma vez que, encontramos ca­sos de pessoas que não vi­bram com o fato de ser ci­peiro. Que pensam que a vi­da na CIPA é como padecer no pur­gatório. Além disto, existem a­quelas situações de que quando se quer "zoar" com um colega, os demais se reúnem e combinam inscrever e votar no colega "zoado" para que ele seja o cipeiro.

A CIPA tem como objetivo a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador. Assim sendo, ser cipeiro exige um estar bem consigo mesmo e querer ajudar o próximo, acreditando que é possível fazer a diferença, ajudando a melhorar as condições laborais nos locais de trabalho. Na prática, os cipeiros ou são atuantes ou são observadores. É difícil encontrar uma CIPA turbinada.

Em uma empresa localizada no interior do Nordeste, a participação dos cipeiros era atuante. Durante as reuniões da CIPA, eles mostravam suas sugestões para a melhoria dos ambientes de trabalho, que quando implantadas resultavam na redução dos acidentes e das doenças ocupacionais.

No entanto, havia uma situação em que não se conseguia uma solução. O problema era que ao saírem do restaurante em que faziam suas refeições, os funcionários não realizavam todo o percurso da rampa. Para diminuir o trajeto, eles pulavam por cima do guarda-corpo, o que causava um grande risco de acidente. Era uma questão cultural. Mesmo tendo casos de funcionários com pequenas contusões nas quedas, nada era reportado. A ideia era aproveitar o tempo de almoço para outros fins, por exemplo, jogar dominó, pinball, ver os gols na TV e até dormir um pouco.

Em uma dessas reuniões, começou-se a discutir melhorias para a rampa da saída do restaurante. No auge da discussão para decidir o que poderia ser colocado no guarda-corpo para se evitar acidentes, um dos cipeiros levantou e falando sério su­geriu de se colocar uma cerca elétrica, e, assim eles não pu­lariam mais o guarda-corpo. Todo mundo se olhou não acreditando no que tinham acabado de ouvir e começaram a rir. Alguns até saíram da sala. Ao ver o sorriso estampado no rosto das pessoas, uma cipeira incrédula no que via, jogou a toalha e caiu no choro.


BUSCA FRENÉTICA
Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada, com a colaboração do leitor Marcelo Silveira

Quando pesquisamos quais os equipamentos com maior ín­dice de interdição, ela aparece. Está em todo canto do Brasil. Parece que ninguém vive sem ela. Estou falando da serra circular, que se encontra enquadrada na classe de equipamentos que não suprem patamares mínimos de segurança para sua utilização, mesmo atendendo os requisitos da NR 18.

Tanto é que, com a revisão da NR 12, iniciou-se a realização de testes com alguns protótipos para o atendimento dos requisitos da norma. Se aprovado, deve virar anexo da norma e evitar acidentes como o ocorrido em um canteiro de obras de uma empresa do Sudeste brasileiro em 1994.

Nela trabalhava um recém-formado técnico em Segurança do Trabalho que num certo dia, quando estava reunido com sua equipe do SESMT e com a equipe responsável pela manutenção e reforma de uma caldeira aquatubular desta mesma empresa, presenciou a chegada em desespero de um funcionário de outra empreiteira (que ficava ao lado do canteiro principal). Ele estava pedindo socorro para um colega que havia se acidentado em uma serra circular.

No local havia um carro à disposição e houve a solicitação de levar o trabalhador acidentado até o serviço médico da contratante. Ao chegar até o local, o técnico de segurança verificou o ocorrido. Estava o funcionário com a mão enrolada em um pano, todo encharcado de sangue, dizendo que tinha corta­do o dedo na serra. O dedo indicador - constatou o jovem téc­nico de segurança, que colocou o trabalhador no carro e pe­­diu para o motorista levá-lo ao serviço médico para atendimento.

Passados alguns minutos, o técnico de segurança foi chamado no rádio, quando lhe foi perguntado se o pedaço do dedo cor­tado tinha sido encontrado e se ele podia levá-lo até a enfermaria. Iniciou-se então uma busca frenética pelo dedo, ou melhor, pela metade do dedo do acidentado. Foi quando um dos colegas disse:

- A gente jogou no lixo.

- Que lixo? - lhe foi perguntado.

- Nesta lixeira aqui - respondeu o operário.

A lixeira foi revirada e logo surgiu o pedaço do dedo, que prontamente foi enrolado em um pano e colocado num copo plástico com gelo e rapidamente foi levado até a enfermaria. Todo mundo ficou ansioso pela resolução do caso, mas com a rápida intervenção dos médicos que o atenderam soubemos que eles conseguiram reimplantar o dedo cortado.

Lição aprendida, história viva até hoje. Experiências como estas nos fazem personagem de livro. O problema é que não saímos mais dele. O melhor mesmo é não vivê-las.

EMPREGADO 171
Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada, com a colaboração do leitor Eduardo C. Barbosa

O termo "você é um 171" vem do Código Penal (Título II, Capítulo VI, Artigo 171) Brasileiro. Neste capítulo é abordado o es­telionato, considerado crime econômico. Ou seja, quando se obtém vantagem ilícita, para si ou para outro, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento. No entanto, no popular o termo é usado de forma indiscriminada, seja para xin­gar ou para zoar alguém.

Em uma empresa do Sudeste do Brasil, havia um funcionário que tinha adquirido a fama de ser 171. Também pudera, ele não ajudava. Não gostava de trabalhar. Vivia inventando desculpa para os atrasos e volta e meia pedia para sair mais ce­do. Além disso, fingia que usava seus EPIs ou o fazia quando alguém do SESMT aparecia na área.

Como já não aguentava mais aquela rotina de trabalho, ele planejava dar um "nó". Então, bolou um plano para ficar em casa na maior mordo­mia, tomando umas cervejinhas e vendo futebol na TV. Para is­so, num certo dia, viu que ninguém estava olhando e se jogou de cima de uma máquina, provocando um acidente de trabalho.

Não deu outra. Perna quebrada e engessada até acima da co­xa. Era o que ele queria: ficar em casa por pelo menos uns 30 dias. Só que logo no primeiro dia de "férias" ele viu que as coisas não seriam como tinha pensado. Isso porque a mulher, aproveitando que ele estava em casa, pediu para que ele fizesse pequenos consertos. Mesmo se fazendo de coitadinho, ela não deu moleza. Sacou que era manha e não deu sossego. Era trocar lâmpada, consertar vazamento, pintar paredes do quarto das crianças e tomar conta delas enquanto visitava as amigas.

Chegou um ponto em que ele não estava mais aguentando aquela rotina, uma vez que não tinha conseguido ainda, após 20 dias, tomar aquela cervejinha sossegado. Não aguentando mais ficar em casa, ligou para a empresa implorando ao seu chefe para que o deixasse retornar imediatamente.

No seu retorno ao trabalho, voltou totalmente diferente do que era. Passou a dar um valor enorme ao seu trabalho. Nunca mais chegou atrasado e nunca mais pediu para sair mais cedo. Tornou-se um empregado modelo, usando os EPIs, trabalhando com seriedade e presteza, fazendo com que o apelido "Empregado 171" fosse esquecido.

Ele deu nó, mas era do bem. Sua estrela um dia ia ter que brilhar e brilhou.


VIVENDO E APRENDENDO
Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom
Guto Velhada, com a colaboração de Maria Iolanda de OliveiraViver é um aprendizado constante. Todas as transformações pela qual passamos em nossas vidas advêm disto. Na Segurança do Trabalho também é assim. A grande maioria das me­lhorias que são sugeridas às empresas é aprendida pela dor e ignorância (no bom sentido) sobre os perigos existentes nas atividades laborais.

Foi o que aconteceu com uma técnica de Segurança do Trabalho recém-formada ao começar em uma fá­brica de máquinas de cos­tura doméstica, localizada no Ceará. Ela tinha em seu currículo apenas um es­tágio, feito em um hospital.

Em seu primeiro dia foi recebida pelo pessoal do SESMT, sendo que o engenhei­ro de segurança decidiu fazer as honras da ca­sa, levando-a para conhecer as instalações. Durante o trajeto, ele foi tentando colher o que ela conhecia da área. Na primeira parada, ele pediu a ela um relato sobre as suas impressões iniciais ao ver o ambiente pela primeira vez.

Ela ficou maravilhada com a dimensão do local, com o funcio­namento das máquinas e começou a fazer comentários vagos, cheios de adjetivos. O engenheiro logo a cortou, pedindo-lhe que falasse sobre os riscos ambientais do ambiente. Foi en­tão que ela prontamente pediu uma semana para começar a visualizar os riscos, pois, em sua opinião, tudo estava perfeito.

Após isso, foram ao setor de pintura, onde havia um cheiro forte de tintas e solventes, que ela interpretou como sendo per­fume. Numa ida à estação de tratamento de efluentes, ela ficou intrigada com as árvores que cercavam o ambiente. Isso porque elas estavam todas meio esbranquiçadas.

- Por que vocês pintam as árvores? Deve fazer mal, pois isto é uma forma de agressão, de mau trato - questionou a novata.

Nesse momento o engenheiro respirou fundo e disse:

- Entenda, a tinta na árvore é sinal de poluição. Precisamos melhorar o sistema de exaustão, implantar cortina d´água para conter as gotículas da borrifação da tinta, e assim mantê-la longe dos operadores e, consequentemente, do ambiente.

Já na oficina de solda, o engenheiro pegou um eletrodo e lhe entregou. Ela, toda fa­ceira, chamou o eletrodo de incenso.

Foi quando ele desistiu do passeio, retornando à sala do SESMT. Lá, ele relatou o passeio para os técnicos de segurança que não paravam de dar risadas. Ele então lançou o desafio para a equipe de orientá-la. Propôs um prazo de três meses para decidirem sua permanência.

O milagre aconteceu e eles conseguiram cumprir a tarefa ple­­namente. Hoje, pas­sados quatro anos, ela ainda está na em­presa vibrando com os desafios que surgem no dia a dia.

ALICE NA EMPRESA DAS MARAVILHAS

Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada

Só que logo que chegou à empresa foi percebendo que SST não era o forte da companhia. Mesmo assim, estava sempre em cima, fazendo acontecer. Só que pouco a pouco o desânimo começou a brotar e, quando chega, é difícil reverter.

 Um belo dia, ela se dirige à área em que se realiza o manuseio de produtos químicos e dá pela falta do chuveiro de emergência e lava-olhos. Ao se questionar sobre onde eles teriam ido parar, ela acabou indo à oficina mecânica reclamar com o encarregado sobre a retirada dos equipamentos sem sua autorização. Neste momento, os presentes no ambiente deixaram brotar um sorriso no rosto. Foi quando o encarregado disse:

 - Sabe o que é? É que a nossa unidade de Minas Gerais vai ser auditada por um OCC contratado pelo nosso cliente principal. E se eles forem lá, não darão conformidade porque lá não tem chuveiro e lava-olhos, e precisa ter.

 Ela ficou furiosa, mas lembrou que seria perda de tempo bri­gar e dizer que isso estava errado. Sua decisão foi intensificar o envio de currículo procurando outras vagas. Esse dia chegou e lá foi ela para o novo emprego. Ao sair da empresa que estava deixando para trás, disse:

 - Adeus empresa das maravilhas, e que este faz-de-conta um dia acabe.

 Sem saber, ela estava deixando de ser Alice.


A VELHICE QUE QUEREMOS

Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom

Guto Velhada

Grande parte da população tem medo de envelhecer. Só que este é um caminho inevitável. Infelizmente, temos que lidar com as mazelas das doenças. O corpo adoece e torcemos para ter a mesma velhice do Niemeyer ou da Dona Canô, grandes nomes da chamada melhor idade. En­velhecer está no texto de nossa vida desde que nascemos. Então, viva isso com dignidade e vontade, aliado, é claro, a grande sabedoria adquirida ao longo do tempo.

Há alguns anos, um jovem profissional da área de Saúde e Segurança do Trabalho, que anos depois se tornaria referência numa determinada área de conhecimento da SST, esta­va terminando seu curso técnico. Em vista disso, se encontrava na fa­se de elaboração da sua monografia. Para tanto, vislumbrou a pos­sibilidade de contar com um já conhecido professor, que ti­nha em torno de 80 anos, para orientá-lo. O então aluno fazia pesquisas com o renomado professor para uma instituição da área de SST.

Só que para isto, ele precisava oficializar o pedido. Foi aí que pediu ao professor de seu curso se podia contar com o gabaritado mestre da área prevencionista como orientador da sua monografia, no que foi imediatamente interpelado por esse:

- Ele ainda está vivo? Nossa, ele foi meu professor há muito tempo. Já deve estar prá lá de Bagdá. Não dá para você contar com outra pessoa não?

Atônito com a conversa, o aluno respirou profundamente e respondeu de imediato:

- Não. Foi ele que escolhi e nosso trabalho já está adiantado.

O professor cedeu ao pedido do aluno, desde que ele aceitas­se uma condição: no dia da defesa, se fosse possível, ele teria que trazer o seu orientador, pois gostaria de revê-lo e de abraçá-lo. O aluno prontamente concordou com o pedido. Então, no dia da defesa de seu trabalho, ele chegou na companhia de seu mestre, que se mostrava todo serelepe e falante, esbanjan­do saúde e de bem com a vida. As rugas bem quietas. Nisto, surge o professor avaliador, andando meio curvado, apoiado nu­ma bengala, pois tinha sido vítima de uma doença que restringiu seus movimentos. Em virtude disso, ele estava com uma aparência bem envelhecida. Tanto que ao ver o seu antigo professor, tomou um susto, mas não deixou transparecer.

O aluno foi aprovado com louvor e ao sair com o seu orientador, comentaram sobre o ocorrido. É que antes do encontro, o jovem profissional contou para seu mestre que o professor do curso havia perguntado se ele ainda estava vivo. Resultado: ambos saíram rindo, pois ele era a prova de como queremos envelhecer.


Documentação de peso

- Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom
- Guto Velhada, com a colaboração do leitor Silas Kalleb C. Silva / Edição 242 - Fevereiro 2012


As auditorias são planejadas, executadas e reportadas para, de uma forma geral, revisar e avaliar o desempenho e a ­eficácia do Sistema de Gestão Individual (por tema) ou Integrado (todas as áreas) das empresas. Isto inclui Qualidade, Meio Ambiente, Segurança, Saúde e Responsabilidade Social, podendo ser realizado por pessoal interno ou externo.

O auditor tem uma lis­ta extensa de atributos como, por exemplo, não fazer julgamentos, nem vir com ideias pré-concebidas. Ele precisa compreender como o Audi­ta­do faz sua Gestão, de­ven­­do estar atento às contra-auditorias. Foi o que aconteceu em uma em­presa de telecomunicações, em que ia ser realizada uma auditoria e fiscalização. Apesar do clima tenso, havia uma disputa. Afinal, ninguém queria tomar uma não conformidade.

Quando o grande dia chegou, tudo transcorria normalmente, até que o técnico em Segurança do Trabalho (aqui chamado de Rui), que estava auditando as questões relacionadas à Saú­de e Segurança do Trabalho de uma destas empresas ter­ceirizadas, chegou e foi levado a uma sala de reuniões onde se fazia presente o auditado, o engenheiro Pedro (nome também fictício).

Ao fim da reunião inicial, Rui então pediu evidências objetivas de alguns programas e ações. Pedro, que aparentava calma, foi apresentando toda a documentação solicitada. O auditor, por sua vez, só ia dando um "Ok" na sua lista de ­verificação. Porém, ficou faltando um documento e o Rui exigiu que fosse apresentado. Foi quando o auditado falou que o documento so­licitado estava no Recursos Humanos e convidou o técnico pa­ra acompanhá-lo até o RH para mostrar o documento. Só que este, do alto de sua autoridade, disse que o documento ti­nha que ser levado até ele na sala de reuniões. Pedro tentou dissuadi-lo e relutou em buscar os documentos. Com isto, o au­ditor, em um tom ameaçador, disse:

- Se você não apresentar a documentação, vou aplicar não- conformidade.

Ao ouvir a palavra mágica, Pedro foi correndo buscar os documentos. Demorou um tempo considerável e quando surgiu, todo esbaforido, suando as bicas e falando impropérios, car­regava um armário de dois metros de altura em cima de um car­rinho-de-mão amarrado por uma corda, que colocou ao lado da mesa. Ao ver a cena, Rui disse:

- Por que você não falou que era mais de um documento?

Ao ouvir isto, o engenheiro foi a nocaute, não acreditando no que ouvira.

Colidindo com a cascavel

- Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom
- Guto Velhada, com a colaboração do leitor Sandro Javert T. Silva / Edição 241 - Janeiro 2012


Quem já viveu a situação de ter contato com um animal peçonhento sabe que literalmente o "bicho pega". Eles são assustadores e temidos pelos homens, o que faz sentido. Isto porque animais peçonhentos são, por definição, "aqueles que, por meio de um mecanismo de caça e defesa, são capazes de injetar em suas presas uma substância tóxica produzida em seus corpos, diretamente de glândulas especializadas (dente, ferrão, aguilhão), por onde passa o veneno, e agem por instinto de sobrevivência". Ou seja, ao sentirem-se ameaçados, imobilizam o agressor e fogem para um local seguro.

Em virtude disto, o trabalho em áreas rurais pode reservar muitas surpresas e problemas durante o seu dia a dia, principalmente com as situações adversas de tempo e clima. Tanto que estes últimos, em algumas regiões do Brasil, representam um número expressivo do percentual estatístico dos acidentes de trabalho. Todos os anos muitos colaboradores vivem a experiência de ter contato com esses animais, e as consequências em geral não são boas, mesmo com toda a proteção individual utilizada.

Alguns anos atrás, em uma empresa da área rural, um colaborador, destes que ficam tirando "sarro" dos outros, sempre "jogava pilha" nos colegas quando estes contavam suas histórias sobre eventuais "encontros" com animais peçonhentos. Ele procurava descaracterizar a importância do fato e seu bordão era: "Vê se acontece comigo!".

Só que num certo dia ensolarado, durante uma inspeção de campo envolvendo máquinas agrícolas, ele foi até uma máquina, que se encontrava dentro do talhão, para avisar o operador que o técnico em Segurança do Trabalho realizaria ali uma inspeção de rotina. Foi quando ele voltou no mesmo instante totalmente aterrorizado, olhos vidrados, assustadíssimo. Parecia que tinha visto assombração. Ao retornar à clareira, onde estavam os outros colaboradores, falou quase que balbuciando:

- Eu estava transitando pelo talhão e de repente, não mais que de repente, acabei colidindo com uma cascavel.

Todos começaram a rir e então um colega perguntou às gargalhadas:

- Não teria sido um elefante?

O funcionário assustado fez cara de bravo e começou a xingar os demais. No entanto, a situação virou um clássico. Tanto que do seu ato ele acabou ganhando o apelido de CCC (Colidindo Com Cascavel), alcunha pelo qual ele passou a ser sempre chamado.